Experiências no pós-doc

Japão – Evento com Especialistas de Columbia

 

Tenho acompanhado atentamente as notícias e as análises de especialistas sobre o terremoto que atingiu a costa nordeste do Japão, no dia 11 de março. Além dos meus mais profundos sentimentos pelas perdas humanas, não tenho nenhuma contribuição essencial para o tema; não sou especialista em economia japonesa, apenas admiradora da cultura e da história desse povo heróico e resiliente.

Exatamente por isso procurei aprender mais um pouco ouvindo especialistas da Universidade de Columbia, num evento realizado ontem, dia 22 de Março, intitulado “The Economic, Health, and Political Consequences of Japan’s Earthquake”, e vou reportar aqui os pontos que considerei mais interessantes da fala de cada um dos especialistas, claro que sob meu próprio filtro.

O primeiro a falar foi Professor Brenner, especialista em efeitos da radiação sobre a saúde, que começou explicando como funciona uma usina nuclear e como pode haver vazamento de material tóxico em casos como o do Japão. Primeiro, os reatores desligam automaticamente na ocorrência de um terremoto, e como houve falta de energia, a refrigeração necessária mesmo com os reatores desligados não ocorreu, levando à necessidade de liberação de vapores radioativos como medidas emergenciais, evitando uma catástrofe nuclear. A contaminação tem sido mínima, e segundo esse especialista, não deve causar dano algum à população da região no curto prazo. O problema está no acúmulo do material radioativo (I-131 e Cs-137, principalmente) no ambiente no médio e longo prazo, o que requer um programa de acompanhamento da população, da produção agropecuária e da cadeia alimentar como um todo. Isso porque o I-131 tem meia-vida física de 8 dias e o Cs-137, de 30 anos. Ou seja, a cada 30 anos metade da quantidade do elemento se desintegra, no caso do Cs-137. Já a meia-vida biológica (considerando os efeitos desses elementos sobre os seres vivos) é se 3 meses para o I-131 e de 70 anos para o Cs-137.  Professor Brenner também apresentou uma interessante tabela em que  mostrou os principais caminhos de exposição das pessoas a tais elementos radioativos: 55% bebendo leite e 15% por meio do consumo de outros tipos de alimentos, produzidos na região atingida; 15% por inalação e 15% por exposição direta. Assim, as medidas imediatas são evacuação e proibição do consumo de produtos, leite principalmente, da região. Quantos aos efeitos sobre a saúde de uma baixa dose de exposição (a qual ainda não foi alcançada no caso japonês), citou um pequeno aumento no risco de desenvolver câncer no longo prazo: esse risco ao longo da vida “normal” é de 44%, com a exposição a doses baixas, aumentaria para 44,3%. Ele também chamou a atenção para a possibilidade de ocorrência de psico-sintoma, numa escala mais geral, como foi verificado no episódio de contaminação por Cs-137 em Goiânia em 1987, em que diversas pessoas que não estavam de fato contaminadas foram atendidas em hospitais com queixas de sintomas de contaminação, o que também requer atenção das autoridades de saúde japonesas.

Quanto as consequencias econômicas, Professor Weinstein começou sua exposição alertando para o fato de que a atividade econômica japonesa está intimamente ligada a geografia física, mostrando mapas som fotos de satélite que permitiam identificar as áreas mais populosas e de maior importância econômica nas regiões mais planas fisicamente. A principal área atingida pelos terremoto e tsunami não são de relevância econômica, também por isso acredita que as consequências econômicas não serão severas. Agregou a esse argumento, outro que explica porque não deve haver grande efeito de propagação de uma crise: a utilização da capacidade instalada (máquinas, equipamentos, infraestrutura) estava relativamente baixa antes da ocorrência do terremoto, era de 82%. Ou seja, o Japão não perdeu capacidade instalada significantemente, uma vez que as principais perdas materiais são de bens de consumo duráveis (casas, carros, edifícios comerciais, etc), e terá, agora uma elevação de demanda desses bens que poderão ser produzidos ao longo do tempo sem grandes pressões do lado da oferta. Ele acredita que em 1 ou 2 anos a economia japonesa está restabelecida e com a possibilidade de se mostrar mais dinâmica que anteriormente, devido ao choque de demanda atual. Mesmo em relação ao insumo energético, que poderia ser uma restrição de oferta, Professor Weinstein não vê grandes problemas, lembrando que o sistema energético japonês tem uma diferenciação de voltagem entre o leste e o oeste, que impediria que a energia gerada no oeste fosse transferida para o oeste, mas mesmo assim, os principais centros econômicos não sofreriam escassez de energia no médio prazo, dentro das circunstâncias atuais. O ponto que talvez seja o mais sensível é a sustentabilidade fiscal do governo japonês, que já acumula uma dívida líquida de 114% do seu PIB, mas a estimativa de impacto dos gastos japoneses com a recuperação econômica é de 2 pontos percentuais, o que, segundo ele, não causaria grandes efeitos sobre a sustentabilidade fiscal ao longo do tempo.

Professor Curtis tratou das questões políticas, chamando a atenção para o fato de que o governo japonês têm respondido a esse episódio de forma mais aberta, honesta e afável, inclusive aceitando ajuda internacional, como em nenhum outro momento. Ressaltou a forma como especialistas, comentaristas, cientistas e jornalistas têm falado ao público, de maneira serena, exatamente o que sabem no momento, na cobertura da NHK que ele tem acompanhado. A pergunta para a qual ele não tem resposta é: “Os políticos irão elevar o nível do debate político e aproveitar a energia para reconstruir e crescer que o povo japonês possui?”. Segundo Professor Curtis, os japoneses não necessitam de líderes carismáticos para aglutinar a sociedade em torno de um objetivo, eles não estão em pânico, nem com raiva da natureza ou do governo, eles só precisam de gerenciamento administrativo.

 

Espero ter contribuído de alguma forma, compartilhando um pouco do que aprendi com vocês!

Speakers:

David J. Brenner

Higgins Professor of Radiation Biophysics, College of Physicians & Surgeons of Columbia University; Director of the Center for Radiological Research (CRR); Director of the Columbia University Radiological Research Accelerator Facility (RARAF)

Prof. Brenner is an expert in the field of identifying the effects of low doses of radiation relating to medical, occupational, and environmental exposures, and winner of the the 1992 National Council on Radiation Protection and Measurements Award for Radiation Protection in Medicine.

Gerald L. Curtis

Burgess Professor of Political Science; Director, Toyota Research Program, Weatherhead East Asian Institute, Columbia University

Prof. Curtis has published extensively on Japanese politics and serves as a columnist for numerous Japanese and US news publications. He was awarded the Order of the Rising Sun, Gold and Silver Star by the Emperor of Japan, one of the highest honors bestowed by the Japanese government.

 

David E. Weinstein

Carl S. Shoup Professor of the Japanese Economy; Associate Director for Research, Center on Japanese Economy and Business, Columbia Business School; Executive Director, Program for Economic Research, Columbia University

Prof. Weinstein has written extensively on the economic impact of catastrophic events in Japan as well as on trade, macro, and financial economics. Prof. Weinstein is the winner of numerous grants and awards and has served as an advisor to the Japanese Cabinet Office and to the Federal Reserve Bank.

 

Curtis J. Milhaupt (Moderator)

Fuyo Professor of Japanese Law; Parker Professor of Comparative Corporate Law; Vice Dean, Columbia Law School

Prof. Milhaupt is an expert on the Japanese legal system, and has published widely in the fields of corporate governance and law and economic development.


2 comentários em “Japão – Evento com Especialistas de Columbia”

  1. Roseli, a analise economca nao esta’ boa, pelos seguintes motivos:

    1- O coracao da economia japonesa e’ a area de Tokyo/Yokohama, onde se produz 44% do PIB.

    2- A geracao de energia nessa area caiu pra 31 mil kilowatts, deve voltar para 45 em tres meses, quando entao terao o verao, cujo consumo sobe para 55. Isso significa que o racionamento agora imposto devera’ continuar por varios meses. No minimo.

    3- Como a economia e’ altamente interconectada, muitas fabricas neste “coracao economico” estao paradas por falta de algum componente que era fabricado na area de Fukushima. Isto e’ particularmente fato para as montadoras.

    4- Isto posto, o dado de que a ocupacao da capacidade instalada era de 82% e’ irrelevante, uma vez que caso UMA unica fabrica se torne o bottleneck, o efeito e’ devastador para toda aquela cadeia produtiva.

    5- 30% das empresas componentes do Indice Nikkei tiveram sua producao afetada, metade das quais paralisadas. A GM ja’ paralisou a operacao de sua planta em Shreveport, LA, Alemanha e Espanha (divisao Opel) por falta de pecas japonesas. A Ford esta’ sem tintas preta e vermelha. Essas empresas – e muitas outras que nao sabemos – vao encontrar substitutas. Que nao vao desaparecer assim que as fabricas japonesas voltarem ‘a operacao.

    Um grande abraco

    Kleber

    1. Oi, Kleber!

      Obrigada por sua contribuição!
      Eu acho que a sua perspectiva sobre o problema energético complementa a reportada, uma vez que o professor que fez a palestra estava com um horizonte de tempo de 2 a 3 anos, e vc está nos dando importantes informações para o curto prazo, ao longo dos próximos meses.

      Abraço,
      Roseli

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